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30/05/2014 | 11:12

Especialistas em Infância debatem quem é a criança brasileira

2014_30_05Fonte: Instituto C&A

Estabelecer limites à criança, para que ela aprenda a conviver em sociedade e valorize a alteridade, oferecendo-lhe, ao mesmo tempo,  oportunidades para estimular sua criatividade. A equação demonstra uma forma de promover o desenvolvimento integral da criança,    recomendam os especialistas que compuseram a mesa de debates “Quem é a criança brasileira”, realizada no dia 23 de abril, no SESC Consolação, em São Paulo.

A discussão integrou o I Fórum Prioridade Absoluta, Criança em Primeiro Lugar, iniciativa do Instituto Alana que conta com o apoio do Serviço Social do Comércio (SESC). O evento reuniu especialistas, atores da sociedade civil e do poder público, para dar força e efetivação ao Artigo 227 da Constituição Federal. O artigo estabelece, em grandes linhas, os direitos das crianças, adolescentes e jovens, colocando-os em primeiro lugar nos planos e preocupações do país.

O fórum é uma das ações do projeto Prioridade Absoluta, criado pelo Instituto Alana em dezembro de 2013 para dar visibilidade e contribuir para a eficácia do Artigo 227. O projeto busca informar, sensibilizar e mobilizar as pessoas, especialmente operadores do direito, para que sejam defensoras e promotoras dos direitos das crianças nas suas comunidades, abordando o tema como prioridade absoluta. Para tanto, o projeto atua em quatro eixos: educação, espaços públicos, mídia e comunicação e sistema de direitos.

A mesa de debates “Quem é a criança brasileira” foi composta por César Ibrahim, psicanalista, professor de psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e mestre na área pela mesma instituição; Ilan Brenman, escritor de livros infantis; Irene Rizzini, professora do Departamento de Serviço Social da PUC-RJ e diretora do Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (Ciespi); e Renata Meirelles, educadora e coordenadora do projeto Território do Brincar.

“Para Freud, a criança nasce com uma onipotência narcisista e acredita que a realidade externa deve funcionar de acordo com seu desejo”, explicou Ibrahim. Segundo o psicanalista, o incentivo ou estímulo a essa onipotência pode gerar um adulto compulsivo e destrutivo. “É preciso conter essa impulsividade que busca o prazer imediato para que a criança consiga viver em sociedade e caminhe em direção à alteridade”, completou. A alteridade é um conceito que determina que o homem que vive em sociedade se relaciona e interdepende de outros.

“É essa falta de freios civilizatórios que vemos cada vez mais difundida em nossa sociedade, em especial nas classes mais abastadas, que explicam fenômenos ocorridos recentemente de jovens que prendem jovens em postes com a justificativa de fazer justiça”, considerou Ibrahim. “Nossas crianças estão clamando por proteção e por privação para geração de desenvolvimento”, acrescentou.

Com uma visão mais focada na prática e no convívio direto com seu público, como escritor de livros infantis Ilan Brenman afirmou que as crianças possuem um olhar de 360 graus. “Elas têm um olhar universal, enxergam e percebem tudo ao seu redor. Veem o grande e o pequeno, as formigas e os elefantes”, afirmou. Para o autor, este olhar criativo, tão marcante na criança e perdido ao longo dos anos pelo adulto, é que deve ser estimulado para que ela se desenvolva integralmente.

O escritor também frisou que a criança é pequena, mas não é simples. “Pelo contrário, é complexa”, afirmou. “É preciso oferecer tudo para que ela se entenda e se descubra”, disse Brenman, apontando a leitura como uma forma de estimular a criatividade da criança: “As histórias preservam a infância e promovem trocas”.

Além da leitura, outra forma de estimular a criatividade da criança é o brincar, tema levado ao debate por Renata Meirelles. A educadora apresentou o projeto Território do Brincar, iniciativa que conta com o apoio do Instituto Alana e que consiste em um trabalho de escuta, intercâmbio de saberes, registro e difusão da cultura infantil. Entre abril de 2012 e dezembro de 2013, a equipe do projeto percorreu comunidades rurais, indígenas, quilombolas, grandes metrópoles, sertão e litoral, coletando dados sobre o brincar. Além da educadora, o projeto também tem a coordenação do documentarista David Reeks.

“As crianças trazem na brincadeira o que elas têm de mais vigoroso em sua alma”, afirmou Renata. “Elas se comunicam entre si pela brincadeira. E isso é fundamental para o seu desenvolvimento”, explicou.

Para ilustrar a influência do brincar na formação das crianças, Renata escolheu duas das brincadeiras que foram pesquisadas em seu projeto: “caçador” e “casinha”.

“Quando os meninos se reúnem para caçar um bicho na mata, eles precisam desenvolver um olhar objetivo, gestos precisos, paciência e outras características muito importantes para que eles lidem com seus dilemas”, afirmou. “Na brincadeira de casinha, fica evidente a noção de organização do mundo: limpar o terreno, organizar o espaço, dividir as tarefas da casa, deixá-la bonita. A cozinha é um território à parte, onde é possível transformar elementos e substâncias por meio das receitas culinárias”, disse Renata.

Irene Rizzini apresentou um panorama histórico sobre a construção de uma visão de infância, concebida no final do século XIX e início do século XX, mas que ainda permanece no imaginário da sociedade brasileira, segundo a especialista. “O que foi construído foi a ideia do ‘menor’. Do menor que traz os genes da pobreza e da criminalidade com ele”, afirmou Irene. “Nesta linha de pensamento, muitos acreditam que a legislação para crianças e adolescentes não é para todos, não serve para nossos filhos, mas só para os pobres, para reformá-los. É por isso que as políticas públicas na área normalmente promovem alianças entre a assistência social e a área judicial”, finalizou.

No que se refere à infância como tema de prioridade absoluta, César Ibrahim lançou uma provocação, ao afirmar que as crianças não são prioridade porque a humanidade não é prioridade no mundo em que vivemos. “Nos últimos dois séculos, tivemos muitos avanços tecnológicos, mas os avanços humanos ficaram na superfície, na camada de esmalte”, concluiu.

Instituto Alana é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos que trabalha para encontrar caminhos transformadores que honrem a criança. Para tanto, atua em um amplo espectro em busca de garantir condições para a vivência plena da infância, fase essencial na formação humana. A instituição é reconhecida por seu engajamento a favor da proibição da publicidade voltada para crianças.

 

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